quarta-feira, outubro 14, 2009

O Estado de S. Paulo
Pesquisa indica que 37% dos assentados não produzem nada
Roldão Arruda

Distribuir lotes de terras para famílias pobres pode não ser a melhor forma de ajudá-las a superar a pobreza. É o que indica uma pesquisa feita pelo Ibope, a pedido da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), em assentamentos da reforma agrária no País.

De acordo com os resultados, 72,3% das famílias assentadas não conseguem gerar nenhum tipo de renda com a produção de seus lotes. Desse conjunto, 37% não estão produzindo nada; 10,7% não conseguem o suficiente para garantir o próprio abastecimento; e 24,6% produzem somente o necessário para se alimentar. O bloco dos que alimentam a família e vendem excedentes, gerando renda, é de apenas 27,7%.

A pesquisa abrangeu mil famílias assentadas, em nove Estados. Os resultados, segundo a presidente da CNA, senadora Kátia Abreu (DEM-TO), expõem a necessidade de se reformular a política de reforma agrária. Estamos diante de um modelo fracassado, afirmou. Não podemos continuar mantendo uma política que fabrica mais pobreza enquanto promete acabar com ela. O fato de 72,3% dos assentados não conseguir gerar renda mostra que essa reforma é inviável.

O Movimento dos Sem-Terra (MST), que luta pela reforma agrária, contestou a pesquisa, qualificando-a de ridícula e arbitrária. Em comunicado à imprensa, a organização alegou que a situação de nove assentamentos não reflete a realidade e lembrou que a CNA representa grandes proprietários. Estranhamos que o Ibope se preste a esse tipo de trabalho, para atender aos latifundiários.

A sobrevivência nos assentamentos, segundo a pesquisa, é garantida em grande parte por auxílios de fora. Verificamos que 49% da renda circulante não vem da terra, mas sim de aposentadorias, pensões, Bolsa-Família, seguro desemprego, observou o assistente social Marcelo Garcia, secretário executivo do Instituto CNA.

Garcia tem experiência na área. Ele chefiou a Secretaria Nacional de Assistência social no governo de Fernando Henrique Cardoso e também atuou na Prefeitura do Rio. Mesmo assim disse ter ficado impressionado. Os indicadores sociais dos assentamentos se equiparam aos de países africanos. Se o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do Brasil fosse medido apenas pelos assentamentos, teríamos ficado no nível baixo - em vez do nível médio no qual o País se encaixa.

Sem conseguir produzir para gerar renda, 37% das famílias assentadas ainda vivem em situação de extrema pobreza - com menos de 1/4 do salário mínimo per capita. A média nacional de famílias nessas condições é de 17%. Outro indicador preocupante, segundo Garcia, é o de analfabetismo, que chega a 21% nos assentamentos, muito além da média do País, de 9%.

O levantamento indica que 52% das famílias instaladas não são as escolhidas originalmente pelo programa de reforma. Elas chegaram até ali por meio de doação de familiares ou pela compra do lote - o que é ilegal.

PRONAF

Outro fator pode estar associado ao baixo nível de produção - 75% das famílias não têm acesso ao Programa Nacional de Desenvolvimento da Agricultura Familiar (Pronaf) - criado para favorecer a pequena produção.

Garcia, da CNA, discordou. Mesmo considerando que o País tem cerca 7 mil assentamentos, com 1,1 milhão de famílias, ele disse que os números, obtidos por amostragem, refletem muito bem a realidade.

A pesquisa põe mais fogo no debate que a CNA vem travando com o MST e outras organizações em torno da questão de invasões de terras para a reforma agrária. Kátia é uma das autoras da proposta de criação de uma CPI para investigar o repasse de recursos ao MST.

O lado mais trágico dos números levantados pelo Ibope, na avaliação de Garcia, é que a situação social nos assentamentos tende a piorar. Os números indicam um rápido envelhecimento da população, observou. A tendência é uma diminuição ainda maior nos índices de produção, tornando as pessoas cada vez mais dependentes de recursos de fora, como aposentadorias.

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