quarta-feira, outubro 14, 2009

Folha de S. Paulo
Vale x Planalto, um jogo a ser degustado
Elio Gaspari

Nessa briga ganha-se mais estudando os dois lados do que torcendo, de saída, por qualquer um deles

HÁ MUITO TEMPO não aparecia uma briga tão interessante como a da Vale com o comissariado petista. A mineradora é a segunda maior empresa do país, emprega 53 mil pessoas e em 2008 lucrou R$ 21,3 bilhões. Seu negócio é vender minérios e a briga destina-se a decidir quem manda nela.

A Vale foi privatizada em 1997. Num lance exemplar da privataria tucana, o dinheiro da Viúva continua lá, mas a senhora não manda. Somando-se as participações de seus fundos de pensão (Previ e Funcef) à do velho e bom BNDES ela teria votos suficientes para mandar na empresa, caso se tratasse de uma padaria. Um acordo de acionistas entregou o leme da Vale ao Bradesco, que tem 21% do capital votante. Foi do Bradesco que saiu o atual presidente da empresa, Roger Agnelli, em cujo mandarinato dobrou-se a produção e quintuplicou-se o lucro.

Apesar desses resultados fantásticos, a Vale carrega a urucubaca de exportar minério e importar navio. A empresa está fechando um negócio de US$ 1 bilhão com a indústria coreana, mas quem conhece as mumunhas do cartel naval brasileiro acha que ela faz muito bem.
Lula e Agnelli estabeleceram uma relação afetuosa. O empresário entrou na vaquinha que pagou a reforma do Alvorada, recrutou diretores no BNDES e tornou-se figura fácil nas celebrações do Planalto. Esqueceu-se que Nosso Guia é um urso devorador de donos.
Em dezembro de 2008, num episódio inesquecível, Agnelli propôs o congelamento de um pedaço da legislação trabalhista (medidas de exceção) para conjurar a crise. Em seguida a Vale iniciou uma política de demissões que já desempregou mais de 2.000 pessoas. Lula reclamou das medidas, contrariado porque não o avisaram. Olhando-se a crise pelo retrovisor, fica entendido que a diretoria da Vale apavorou-se.

Assim como sucedeu com as empresas de telefonia, os comissários dos fundos de pensão começaram a se desentender com os controladores da empresa. Como o Bradesco não é nenhum Daniel Dantas, a briga será boa. Ela melhorou com a entrada em cena de um novo ator, o magnata Eike Batista.

Batista e Agnelli são empresários-celebridade. Em uma semana o presidente da Vale fala mais que Augusto Trajano de Azevedo Antunes, o grande potentado do minério brasileiro, em todos os seus 90 anos de vida. Eike Batista, o fulgurante bilionário do conglomerado dos X, faz força para ser Warren Buffett, mas a cada dia parece-se mais com Donald Trump. Ele quer comprar uma parte das ações do Bradesco, senão todas. Numa trapaça da história, Eike é filho do grão-duque da Vale estatal, o engenheiro Eliezer Batista.

Brigas desse tipo estimulam uma tendência para se tomar partido logo que o jogo começa. É muito melhor acompanhá-las dando razão aos dois lados. A Viúva tem as ações e não manda? Os fundos de pensão querem mandar para mensalar a Vale? Eike Batista sentado no conselho da empresa terá mais a oferecer que os atuais mandarins? Ele viria a ser a esperada figura do bilionário-companheiro do PT? Se a Vale despejar dinheiro em projetos industriais brasileiros fará bem ao país ou à megalomania dos sábios do Planalto?

Uma coisa é certa: a permanência ou a saída de Agnelli na presidência da Vale é uma irrelevância diante da verdadeira briga, pelo controle da segunda empresa do país. A primeira é a Petrobras e já está dominada.
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