"Se coubesse a mim decidir se precisamos de um governo sem imprensa ou de uma imprensa sem governo, eu não hesitaria um momento em escolher a segunda alternativa". - Thomas Jefferson
OBrasil apresenta hoje alguns vetores que mostram claramente que a luta contra o nosso crônico déficit de cidadania política está em xeque: seguidas ameaças à instabilidade das instituições democráticas, a exemplo do que vem acontecendo com alguns de nossos países vizinhos; degradação ampla e visível dos costumes políticos, alavancada pela impunidade proporcionada por códigos de processo civil e penal totalmente defasados, além de estapafúrdios privilégios como foro especial e o quase ilimitado número de recursos possíveis em um processo judicial; déficit de entendimento e prática de cidadania justamente pelo segmento social que deveria dar o exemplo, que ainda confunde lei com limitação de liberdade, vida com "condições" de vida, Estado com governos, justiça com justiça "social", igualdade social com igualdade perante a lei, público com privado etc.
Mas a questão não é apenas discernir as diferentes naturezas do público e do privado, por exemplo. Sabemos perfeitamente o que é o privado, seja como o ganho entre agentes econômicos no mercado, seja por simples exclusão de tudo aquilo que não é público. A questão fundamental para a nossa cultura de cidadania, enquanto educação política, é entender a complexa natureza do bem público. E isso implica o discernimento entre Estado - enquanto conjunto de instituições dedicadas à garantia e defesa do interesse público - e governos - enquanto atores/condutores temporários de políticas públicas.
Cidadania é, portanto, o controle social de governos pelos cidadãos - exatamente para que aqueles não usem as instituições públicas em seu proveito próprio, sempre parcial por definição - e jamais controle social de governos sobre os direitos fundamentais dos cidadãos, que são tão mais cidadãos quanto se obrigam a disputar com os governantes o controle social das instituições do estado democrático de direito.
Em recente seminário sobre o tema da corrupção, realizado em Brasília em dezembro último, e com ampla participação de empresários e entidades dedicadas ao controle social de governos, uma das moções aprovadas foi a luta pela realização de uma Conferência Nacional de Combate à Corrupção. Embora a entidade que organizou o seminário, a Abracci - Articulação Brasileira pelo Combate à Corrupção e Impunidade - represente hoje mais de 400 empresas e entidades nacionais que trabalham com o tema da corrupção, a divulgação do seminário foi prejudicada pelos eventos simultâneos do Confecom e do COP-15.
Hoje, começamos a esboçar um consenso entre os formadores de opinião de que o país precisa urgentemente desenvolver sua cultura de cidadania política, que nos desperte para a responsabilidade dos mais favorecidos em exercer controle social de governos, mandatos e orçamentos públicos. Qualquer outra concepção de cidadania enquanto solidariedade, civilidade ou caridade, ainda muito presentes na mídia, se torna hoje em dia um luxo esvaziado de sentido estratégico. Parece que nos tem "caído a ficha" de que devemos também promover o discernimento de que as instituições do estado democrático de direito existem mais para servir aos cidadãos pagadores de impostos do que para serem aparelhadas por governantes que delas se servem.
Urge, portanto, convergir ações da sociedade civil organizada, sobretudo entre associações civis de profissionais e empresariais, para disputá-las com os governantes. Na outra ponta, cabe ao empresariado de comunicação mais consciente a tarefa de apoiar continuamente, através de ampla estratégia de alocação de espaços na mídia, as entidades que buscam o resgate dos valores da tradição humanista e do estado democrático de direito no Brasil e na América Latina, como no modelo do crime doesn"t pay americano.
JORGE MARANHÃO é consultor e diretor do Instituto de Cultura de Cidadania A Voz do Cidadão.
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