terça-feira, outubro 06, 2009

O Estado de S. Paulo
A infidelidade consentida
Editorial

Foi como se a Justiça Eleitoral não tivesse resolvido, em 2007, que os partidos são os donos das cadeiras ocupadas nas câmaras legislativas pelos candidatos que por eles se elegeram - e que, portanto, perderia o mandato o político que, a qualquer momento, saltasse de uma legenda para a outra, salvo em poucas circunstâncias previamente estipuladas, tendo o partido prejudicado o direito de preencher a vaga aberta com o primeiro da lista de seus suplentes. Nos últimos dias, dezenas de políticos, para ficar apenas no plano federal, correram a mudar de sigla enquanto houvesse tempo - a um ano das próximas eleições, terminou no dia 4 o prazo para a filiação a alguma legenda de quem queira disputá-las. O chamado instituto da fidelidade partidária, logo se vê, ainda não pegou.

Mais uma vez os políticos em trânsito escancararam para a opinião pública que eles só têm compromissos com as suas chances nas urnas e que, na maioria esmagadora dos casos, os partidos não passam de hospedarias em que a entrada e a saída de trânsfugas são reguladas, não pelas leis, muito menos por qualquer coisa parecida com identidade de ideias, mas pelos cálculos de conveniência de parte a parte - as afinidades eletivas, para dar à expressão de Goethe o mais raso sentido literal. Em 2005, quando nada obstava o ir e vir pelas agremiações, cerca de 60 políticos de maior projeção trocaram de alojamento - uma troca de seis por meia dúzia, diria um cínico -, quase sempre para se candidatar a prefeito no ano seguinte. Agora, embora a infidelidade esteja sujeita a punição, houve 31 transferências.

Em parte, a culpa é da própria Justiça Eleitoral. Dos 18 políticos julgados por pular a cerca desde a entrada em vigor da resolução concebida para dar consistência ao sistema de partidos, apenas um, o deputado federal Walter Brito, perdeu o mandato - e isso depois de encarniçada resistência do então presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia. Em geral, os trânsfugas conseguem se safar invocando as condições em que a transferência é permitida (perseguição política é o pretexto de praxe). Em parte, a culpa é dos partidos, quando - também por cálculos políticos - abrem mão de cobrar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a cadeira que poderia lhes ser devida, com a remoção do ocupante que os deixou.

Em tese, por exemplo, o PT poderia reivindicar o lugar da senadora Marina Silva, que se mudou para o PV. O PSDB poderia fazer o mesmo com a cadeira do vereador paulistano Gabriel Chalita, que se bandeou para o PSB (o qual, aliás, acaba de acolher o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, de quem o baronato industrial paulista decerto não suspeitava que fosse um socialista camuflado). Mas é evidente que, naqueles casos, petistas e tucanos pagariam um elevado preço político - e Eleitoral - se tentassem se vingar dos seus ex-correligionários. Às vezes, os partidos tratam de agir preventivamente para enquadrar os caídos em tentação. Na undécima hora, o DEM do Distrito Federal impediu a transferência do seu senador Adelmir Santana para o PSB. Com a mesa da festa já posta, ele sucumbiu. Vão tomar meu mandato, avisou aos convidados. Não dá para sair.

Em outras situações, o mesmo DEM não moveu uma palha para enquadrar os migrantes em potencial - o que levanta uma indagação que parece dividir as opiniões dos juristas: quando uma legenda desiste da reparação a que teria direito, consentindo, pelo silêncio, com a saída de um parlamentar a ela filiado, deve a Justiça Eleitoral tomar a iniciativa de desalojá-lo da cadeira por transgressão à regra da fidelidade partidária? Para o ministro Fernando Gonçalves, do TSE, citado pela Folha de S.Paulo, não é só o partido que tem legitimidade para requerer a perda do mandato. Poderiam fazê-lo tanto o suplente que iria para a vaga como - e principalmente - o Ministério Público Eleitoral. O primeiro estaria agindo em defesa de um direito particular; o segundo, em defesa de um interesse difuso, a salvaguarda de uma norma com força de lei.

Mas o presidente do TSE, Carlos Ayres Britto, discorda. Se o partido não se sente traído, interpreta, tenho dificuldade de entender por que o Ministério Público sentiria ciúme por ele. Brito acredita que com o tempo, a fidelidade partidária se tornará um verdadeiro dogma jurídico. Não, se depender só dos políticos.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

É chegado o momento das eleições e muitos vereadores do interior, inclusive da nossa região irão trabalhar para deputados de outras legendas como por exemplo um do PDT que irá catar votos para um politico do PSDB e assim sucessivamente.A grande falha dessa democracia que denomino de fajuta,de araque é a falta de seriedade com o Partido no qual o sujeito foi eleito.Será que os vereadores vão atrás de votinhos gratuitamente?????

3:12 PM  
Anonymous Anônimo said...

Gostaria que me apontassem um vereador qualquer que trabalha de graça para qualquer deputado.Notem que a mamata na politica é eleger-se primeiramente,com um absurdo de salario, para depois usufruir na campanha de deputado dois anos mais à frente.É o caso do ano de 2010 quando muitos descem de para-quedas pelo interior distribuindo "guloseimas" que apetecem os vereadores do interior.Fidelidade partidaria é conversa fiada prá boi dormir.Politico nenhum tem interesse em fidelidade.

8:23 PM  

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