segunda-feira, julho 06, 2009


Ação entre amigos

Ricardo Noblat, O Globo

Lula nada fez para evitar a desconstrução e a perda de autoridade moral do Congresso — Senador Tião Viana (PT-AC)

Que país é este onde o chefe de um poder independente como é o presidente do Senado pede socorro ao chefe de outro — no caso, o presidente da República — porque se sente ameaçado de perder o lugar? E ainda justifica o seu comportamento prestando contas do que fez, explicando o que não pode fazer e prometendo fazer mais isso e mais aquilo?

Um gesto desses é de servilismo.

Sarney entrou puxando por uma perna para despachar com Lula na última sexta-feira. Saiu amparado em um par de muletas.

Os norte-americanos chamam de “pato manco? o presidente que decidiu não disputar a reeleição, ou que a perdeu ou que não pode mais disputar.

Sarney só cumpriu cinco de um total de 24 meses como presidente do Senado.

Tem direito de concorrer a um novo mandato.

Não é certo que complete sequer metade do atual.

Em defesa dele, Lula, a ministra Dilma Rousseff e o PMDB puseram em circulação uma série de mentiras ou de falsas verdades. A maior delas: Sarney não é mais culpado do que seus colegas pela crise do Senado.

É, sim. Somente ele presidiu o Senado três vezes.

Foi ele que nomeou e ajudou a manter Agaciel Maia como diretor-geral do Senado durante 14 anos. A Agaciel são atribuídas grossas patifarias que não poderia ter cometido sem o consentimento dos seus superiores.

Que outro senador mais do que Sarney está sendo alvejado por fatos embaraçosos? Ora é um auxílio-moradia para ele que dispõe de duas casas em Brasília. Ora é um neto empregado em gabinete de senador. Ora é outro que vendia seguros de saúde e agenciava crédito consignado para servidores.

Ora é uma penca de parentes e de afilhados pendurados na folha de pagamento do Senado. Ora é uma casa que comprou e que esqueceu duas vezes de declarar à Justiça Eleitoral.

Da série de mentiras para atarraxar Sarney na cadeira de presidente do Senado: se ele cair, a oposição herdará o lugar. O PMDB romperá com o governo e sentará no colo de José Serra, o provável candidato do PSDB à sucessão de Lula. A CPI da Petrobras será instalada no dia seguinte. A governabilidade irá para o espaço.

Em resumo: o fim do mandato de Lula chegará mais cedo do que o previsto.

Sem falar que a recuperação da economia poderá sofrer um forte abalo.

Se Sarney sair, seu substituto será escolhido em um prazo de 15 dias. Dono da maior bancada do Senado, o PMDB comandado por Renan Calheiros (AL) tratará logo de ocupar a vaga com outro nome. Estão em curso a esse respeito negociações preventivas e sigilosas.

De resto, dá para imaginar o pragmático e fisiológico PMDB devolvendo seis ministérios e uma centena de cargos importantes só porque Sarney acabou defenestrado da presidência do Senado?

Perguntem ao PMDB da Câmara dos Deputados se ele está disposto a dar às costas ao governo em solidariedade a Sarney. Está, sim, disposto a oferecer Michel Temer (SP) para vice de Dilma. Perguntem aos governadores do PMDB se Sarney vale mais do que um naco das milionárias verbas do Programa de Aceleração do Crescimento.

Conservar Sarney na presidência do Senado ou tirá-lo não assegura desde já o passe do PMDB na eleição presidencial de 2010. Na hora certa, a maior fatia do partido irá com quem for ganhar.

A CPI da Petrobras ainda não foi instalada porque a oposição não quis. CPI é direito da minoria reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal. Basta acioná-lo para que ela funcione. A oposição prefere deixá-la para depois das férias de julho. O estado de saúde da economia depende dos acertos do governo.

Às vésperas de eleições, deputados e senadores mendigam junto ao governo a liberação de verbas para seus currais de votos. Cadê clima para rebeliões?

Lula deve a Sarney o apoio que ele lhe deu durante a crise do mensalão. Quer zerar a conta. E levar de troco um presidente de Senado combalido. Pouco se lhe dá que para isso tenha de humilhar o PT outra vez. O PT é apenas uma fotografia na parede.

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