sábado, dezembro 30, 2006

26 ANOS SEM CRESCIMENTO ... SEM EMPREGOS, JOVENS SÃO RECRUTADOS PELO NARCOTRÁFICO ... E VIRAM REFÉNS ... SE DESISTIREM, MORREM...
As tropas do crime organizado

Estadão: "O poder público continua levando a pior na guerra contra o narcotráfico. Depois de recrutar, na periferia das grandes cidades, jovens semi-alfabetizados - sem condições de ingresso na economia formal, são-lhes oferecidas alternativas profissionais no submundo do crime -, as quadrilhas passaram a interferir na vida dessas crianças e adolescentes, desafiando entidades comunitárias e instituições encarregadas de oferecer a jovens infratores as condições mínimas de educação para a convivência social.
É esse o caso dos conselhos tutelares, que foram criados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) como órgãos municipais de caráter autônomo e permanente com o objetivo de estimular os pais a agir em cooperação com a máquina estatal, nas áreas de saúde, educação e cidadania. Em muitos lugares, os conselheiros estão descobrindo que, quando suas iniciativas sociais começam a produzir resultados concretos, as quadrilhas passam a ameaçar de morte os jovens dispostos a encontrar uma alternativa ao crime ou, então, a chantagear suas famílias.
A denúncia, que está sendo investigada pelo Ministério Público de São Paulo, foi feita recentemente durante o Congresso Nacional de Conselheiros Tutelares, com base no que vem ocorrendo na zona sul da capital.
Desde 2002, só no bairro do Jabaquara foram assassinados dez adolescentes que tentaram evitar a reincidência no crime, após terem sido beneficiados por programas de erradicação de trabalho infantil.
Por mais paradoxal que seja, o que os levou à morte foi o sucesso das medidas socioeducativas previstas pelo ECA.
Em outras palavras, depois que essas crianças e jovens ganham a liberdade assistida, após passar um período de seis meses a três anos numa unidade de internação, como a Febem, por terem cometido alguma infração, seus direitos básicos são-lhes negados na região onde vivem. Isto porque o narcotráfico não admite perder a mão-de-obra barata constituída por esses menores.
O que se tem, portanto, é uma perversa concorrência entre quadrilhas e entidades comunitárias e órgãos públicos. Para evitar novos assassinatos de crianças e jovens infratores em fase de recuperação no bairro do Jabaquara, os conselhos tutelares e organizações não-governamentais passaram a mandá-los para abrigos distantes ou até para outras cidades. As quadrilhas, porém, em represália ameaçam matar seus pais e irmãos, que continuam residindo no mesmo lugar.
Por temer a morte de familiares, os jovens e adolescentes voltam a atuar como “aviões”, “olheiros” e “vapores”, convertendo-se em reféns do crime organizado. Romper esse círculo vicioso é o grande desafio do poder público.
Quando crianças e jovens vinculados ao tráfico são presos pela polícia e ficam reclusos durante um período, as quadrilhas oferecem cestas básicas, remédios, bujões de gás e até dinheiro às suas famílias, além de assistência jurídica. Vivendo em situação de miséria, os pais não recusam a ajuda e os traficantes tomam conta da situação.
Os gastos são devidamente contabilizados pelos criminosos para posterior cobrança e é selado um compromisso de dívida, num ciclo de pressão e ameaça que só acaba quando os adolescentes são libertados e voltam à favela.
Se não pagarem o que devem, trabalhando para o narcotráfico, eles podem ser executados. E, se aceitarem a alternativa de mudar de região ou de cidade que lhes costuma ser oferecida pelos conselhos tutelares, seus pais podem ser assassinados.
Infelizmente, esse problema não ocorre apenas em São Paulo. Nos Estados que fazem fronteira com a Bolívia e a Colômbia, traficantes e contrabandistas de armas têm recorrido em larga escala ao mesmo esquema de pressão e chantagem, para recrutar mão-de-obra barata.
Sem projetos, sem estrutura administrativa e sem recursos para fazer concorrência às quadrilhas, o poder público vem perdendo a guerra contra o crime organizado. E o mais trágico, como os conselhos tutelares acabam de mostrar, é que nem mesmo o chamado “terceiro setor”, cujos projetos são considerados decisivos para promover inclusão social e neutralizar a violência, está conseguindo atuar nesse cenário de erosão da ordem jurídica e do princípio da autoridade estabelecida."
Google
online
Google