A cara do patrimonialismo lulista
Autor(es): Ricardo Vélez Rodríguez |
O Estado de S. Paulo - 13/07/2010 |
Mal começou a campanha eleitoral e os petistas mostram a que vieram. Isto é, vieram para culminar a obra de desmonte das instituições democráticas, mediante a definitiva consolidação do Estado patrimonial, submetido ao peleguismo lulista. Demétrio Magnoli identificou muito bem essa realidade (A escolha de Serra, 8/7, A2): "O lulismo não é a política macroeconômica do governo, tomada de empréstimo de FHC, mas uma concepção sobre o Estado. A sua vinheta de propaganda, divulgada com dinheiro público pelo marketing oficial, diz que o Brasil é um país de todos. Eis a mentira a ser exposta. O Estado lulista é um conglomerado de interesses privados. Nele se acomodam a elite patrimonialista tradicional, a nova elite política petista, grandes empresas associadas aos fundos de pensão, centrais sindicais chapa-branca e movimentos sociais financiados pelo governo."
Lula acrescentou, sobre essa herança perversa do marxismo-leninismo inserida na ideologia petista, o componente populista. Para essa forma de fazer política o que importa é estabelecer uma espécie de "convívio emocional" entre o líder e o povão que ele diz representar, prescindindo das instituições. Como afirma um dos mais importantes estudiosos contemporâneos do fenômeno, o sociólogo francês Pierre-André Taguieff, na sua obra A Ilusão Populista (Paris, 2007), o líder populista é um demagogo cínico que apregoa a salvação do povinho destruindo as instituições democráticas. Isto é, nem mais nem menos, o que Lula tem feito: desmoralizar as instituições de direito, a começar pela representação política, pela Justiça, pela imprensa livre, pelos Tribunais de Contas e pela vida político-partidária, para, sobre as cinzas da anomia, erguer a sua figura de salvador da Pátria. O atual presidente não duvida um instante em comprometer a credibilidade da nossa diplomacia, tirando dela qualquer seriedade ao acomodá-la aos seus interesses populistas. Acaba de fazer isso na visita ao ditador e genocida Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, da Guiné Equatorial, alcunhando essa vulgar iniciativa de "pragmatismo". O "nosso guia" já tinha tomado atitude semelhante, em múltiplas oportunidades, ao longo dos seus quase oito anos de mandato, em face de outros autocratas, como o presidente do Sudão, ou saindo na defesa ardorosa dos populistas latino-americanos Hugo Chávez, Evo Morales, Rafael Corrêa, Daniel Ortega, para não falar da sua amizade incondicional com os irmãos Castro, que presidem a mais antiga satrapia ibero-americana. E por falar em sátrapas, Lula desmoralizou ainda mais a nossa política externa ao se alinhar, desavergonhadamente, com o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, cuja legitimidade, nas eleições que o guindaram de novo ao poder, é questionada no próprio Irã e pela comunidade internacional. Tudo com a finalidade clara de deixar uma porta aberta para uma desvairada corrida atômica, banida pela nossa Carta Magna. Aliando-se a quem não deve, Lula terminou, de outro lado, brigando com quem não deve, colocando pedras no caminho de dois países latino-americanos que derrubaram as tentativas de tomada acintosa do poder por populistas ou totalitários: foram decepcionantes as reiteradas críticas do seu governo às ações empreendidas pelo presidente Álvaro Uribe, da Colômbia, contra as Farc (ainda não consideradas terroristas pelo governo brasileiro), bem como a tragicômica encenação na embaixada brasileira em Honduras para prestigiar o golpista ex-presidente Manuel Zelaya, aliado de Chávez. Mas voltemos à nossa cena da campanha presidencial que começa. Como muito bem esclareceu o candidato José Serra, as diretrizes de um programa de governo são "a alma" do que se quer, e alguns pontos que constavam da primeira versão da equipe de Dilma são o que o PT realmente defende, "como a facilitação de invasão de terras". Ele citou, ainda, o controle da imprensa. "É tema em que a gente sabe o que eles pensam. Sempre que podem, isso é dito, depois eles vêm e corrigem." O que os adversários mostram, frisou Serra, "não são duas caras, são várias caras". E acrescentou: "Nós temos uma só cara, a minha cara." Garantiu em seguida que as diretrizes de seu programa foram "minuciosamente escritas". Como questionou Magnoli, terá Serra, neste momento, a coragem de apresentar a sua cara de estadista e denunciar a farsa petista que pretende dar continuidade, no Brasil, ao abjeto patrimonialismo, que pratica a privatização do Estado pela elite clientelista tradicional, pela nova elite sindical, pelas grandes empresas associadas aos fundos de pensão e pelos movimentos sociais financiados pelo governo?
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