quinta-feira, julho 08, 2010

Uma esfinge chamada Dilma

Blog do Paulo Renato, 07/07/10

Em poucas horas, o Brasil ficou sabendo que existe mais de uma Dilma. A primeira é a do programa esquerdista registrado no TSE, propondo o “controle social” dos meios de, comunicação, taxação das grandes fortunas, alterações na legislação do aborto e revogação da lei que inibe invasões e a violência no campo. A outra é a que diz que não concorda com nada disso e mandou substituir o programa, alegando que, em função da pressa, o assinou sem ler. Na verdade, a candidata adotou propostas mais “light” para acalmar o PMDB, o mercado e as socialites com quem se reuniu - todos eles alarmados com o retorno do radicalismo petista.

Como não expressa claramente suas ideias e adota discursos ao sabor de cada plateia, Dilma é uma esfinge a ser decifrada. Afinal qual a Dilma verdadeira, a que em Uberlândia fez a defesa do agro negócio e disse que não tolerará invasões de terra ou a que em Sergipe vestiu o boné do MST? E em que acreditar, em suas juras de amor à liberdade de imprensa ou em sua assinatura em um documento que avaliza as propostas autoritárias da Conferência de Comunicação, promovida pelo governo Lula? Difícil crer que o primeiro programa registrado no TSE tenha sido produto do amadorismo de algum setor de sua campanha, cuja “mancada” se deu à revelia da candidata.

A dubiedade de Dilma é reflexo da uma contradição do Partido dos Trabalhadores, que em seu congresso de Fevereiro adotou dois “discursos”. Um foi o da moderação, voltado para a conquista do eleitorado moderado e para assegurar a aliança com partidos conservadores. A chave para isto foi o compromisso da candidata de manter o tripé da política econômica – câmbio flexível, controle da inflação e rigor fiscal. O outro discurso, mais estratégico, pregou um giro à esquerda e o retorno aos tempos em que o PT, ainda fora do poder, defendia a “ruptura necessária”. Na lógica do PT, em algum momento o programa estratégico será levado à prática, se possível no terceiro mandato do lulo-petismo, caso Dilma seja vitoriosa.

Todos os pontos que, por conveniências eleitorais, Dilma mandou suprimir do programa registrado no TSE constam das teses esquerdistas aprovadas no último Congresso do Partido dos Trabalhadores. Eles, portanto, não caíram do céu e não se pode atribuir a um “ descuido” a sua incorporação às propostas programáticas da candidata. O mais factível é que a campanha quis “avançar o sinal”, à base do se colar, colou. Tenteou-se, assim, dar um passo maior do que as pernas e com o aval de Dilma.

Foi um tremendo erro de cálculo que obrigou a candidata a fazer um recuo rapidinho, jogando nas costas do PT a responsabilidade pelas teses esquerdistas que ela diz não concordar, muito embora não se conheça uma só palavra sua condenando tais teses no congresso do PT. Agora, surge mais uma esquizofrenia petista: a candidata e o partido falam coisas diferentes sobre questões essenciais para o Brasil!

O enigma Dilma se torna maior em função da recusa a participar de debates com a sociedade civil. É natural e compreensível que o agro negócio ponha suas barbas de molho quanto a real possibilidade de, caso eleita, ela fazer concessões ao “braço esquerdo” do lulo-petismo e tomar medidas que estimulem as invasões de terra. Estas dúvidas poderiam ter sido dirimidas se a candidata tivesse participado do debate promovido pela Confederação Nacional da Agricultura. Para não desagradar ao seu aliado histórico – o MST – a candidata não atendeu ao convite da CNA.

É extremamente negativo para o amadurecimento da democracia a existência de uma candidata de comportamento ciclotímico, capaz de alterar seu programa em poucas horas, conforme as pressões do momento. Como ela se comportará no poder, caso seja eleita? Cederá à voracidade dos partidos patrimonialistas, ou aplicará o programa esquerdista defendido por setores expressivos do Partido dos Trabalhadores? A dúvida é pertinente, face ao cabo de guerra para definir quem ficará com a maior fatia da máquina pública, caso o lulo-petismo tenha um terceiro mandato.

O Nação não precisa de um presidente que seja uma enorme incógnita e incapaz de resistir às pressões. Para a estabilidade do país, é imperativo que todos conheçam seu pensamento e suas propostas para fazer o Brasil avançar. Só assim não viveremos em um mar de incertezas. E só assim estaremos livres de surpresas desagradáveis que a esfinge pode nos trazer. Por detrás do monstro, nunca há boa coisa.

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