segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Idade da pedra (e da roça)
Vinícius Mota, Folha de S. Paulo de hoje

Ferro, soja, carne, cana, laranja, celulose, café, algodão. As atividades em torno de uma cesta de produtos não muito maior que essa vão determinando a economia política no Brasil. Desde 2003, o segmento agromineral acumulou um saldo em moeda estrangeira de uns US$ 150 bilhões.
Essa montanha de dinheiro estabilizou o país. Acabaram as crises no mundo todo, mas a imunização brasileira tomou a forma específica de um espetáculo no campo e no subsolo. Isso faz diferença.
Na segunda metade da gestão Lula, essa fabulosa corrente de dólares começou a separar vencedores de vencidos na economia e na sociedade. O Banco Central pôs-se a estrangular a oferta de reais a partir do final de 2004, e daí por diante a moeda nacional triunfou sobre a americana. Quem estava distante do circuito rural e mineral (basicamente a indústria) pagou a conta.
Nesse momento as águas se dividiram: ao freio nas manufaturas, nos empregos e no PIB se sobrepôs o avanço no distributivismo estatal. A comunhão entre uma vertente liberal e outra esquerdista foi selada.
O vaticínio da primeira - o Brasil depurado como fornecedor de mercadorias primitivas ao mundo, expressão cabal da teoria das vantagens comparativas- convergiu com a utopia da segunda -nos escombros da era industrial, o Estado deve substituir, com o dinheiro dos tributos, a renda que o mercado de trabalho já não pode propiciar.
O galope da assistência social no Brasil está em harmonia com a emergência da roça e da pedra na economia. Numa democracia de renda per capita modesta, com 160 milhões de pessoas vivendo em cidades, o gigantismo estatal é resposta protocolar à concentração do poder econômico num punhado de setores que pouco empregam.
Esse conúbio entre interesse, ideologia e preguiça não tem data para terminar. A bonança global permite que siga entregando crescimento baixo e anestesiando conflitos por um bom tempo - sem crise.
Google
online
Google