LULA E BUSH
Carlos Bresser-Pereira .
O Brasil está no mesmo ponto que os EUA na última eleição: os democratas não tinham alternativa real a oferecer
"HÁ UMA indignação crescente nas elites brasileiras pela provável reeleição de Lula. Seu governo foi medíocre em quase todos os planos e se viu envolvido em um esquema de corrupção ativa como jamais ocorrera no Brasil e, no entanto, as pesquisas o indicam como provável vencedor no primeiro turno. Como explicar esse fato? Muitos falam no Bolsa-Família, outros no carisma pessoal, outros na ignorância do povo, outros na "boa performance econômica" embora, comparado com 25 países semelhantes, o Brasil tenha-se colocado em 25º lugar em termos de taxa de crescimento. Proponho uma explicação mais simples. O Brasil está na mesma situação que os Estados Unidos na última eleição presidencial. Bush, como Lula, excedeu quase tudo o que se poderia imaginar em termos de mau governo, mergulhando o país em uma guerra desastrosa sob todos os pontos de vista, mas o Partido Democrata não conseguiu eleger seu candidato porque não tinha uma alternativa real a oferecer ao povo americano. Criticava o erro que foi invadir o Iraque, mas não podia propor a retirada do Exército porque isso seria reconhecer uma derrota que o povo americano não estava ainda disposto a admitir. No Brasil, o mesmo fenômeno se repete. O desastre de Lula não é apenas moral, é também econômico. No plano moral, o PSDB tem um melhor desempenho do que o PT, mas não soube distinguir caixa dois da corrupção ativa (apropriação de recursos do Estado e suborno de parlamentares), como não soube punir os poucos membros que se viram envolvidos no escândalo. No plano econômico, o Brasil está estagnado há 26 anos, mas o PSDB no governo não foi capaz de mudar esse quadro e, na oposição, não soube oferecer uma alternativa de política econômica à nação. O governo FHC foi extraordinário em muitos setores, mas falhou na política econômica porque aceitou a ortodoxia convencional como solução. Em 1995, quando o governo começava, essa ortodoxia era de tal forma hegemônica no mundo que se compreende a submissão a ela: não havia no Brasil nenhuma crítica consistente ao Consenso de Washington. Quatro anos depois, porém, o presidente teve a coragem de flutuar a moeda contra a opinião de sua equipe econômica e a de Washington. Não continuou, porém, nessa direção. Quatro anos mais tarde, quando começa o governo Lula, já havia surgido uma crítica consistente à ortodoxia convencional e já haviam ocorrido fatos novos que legitimavam mudança de opinião. Já era mais do que tempo de o PSDB lembrar que o Brasil é ou deve ser uma nação -e que só uma estratégia nacional de desenvolvimento pode tirar o país da semi-estagnação em que está para satisfação exclusiva de seus concorrentes globais. Haverá ainda tempo de mudar as perspectivas negativas que assombram o horizonte? De evitar a reeleição de um presidente que não terá nem apoio parlamentar nem apoio da sociedade civil? De não termos, portanto, um governo que continuará a não governar como não governa desde a crise de 2005? A fragilidade de Lula e do PT é tão grande que essa possibilidade ainda existe. Depende de Alckmin, mas não depende apenas dele. Alckmin é um homem de qualidade, mas sem forças para mudar o quadro de que é parte. O PSDB tem quadros competentes, mas está confuso diante do fracasso da modernidade com a qual se identificou, e à qual faltavam as idéias de nação e de retomada do desenvolvimento. Ainda há tempo, porém, para que suas lideranças e o candidato proponham uma alternativa real aos brasileiros. Não basta que rejeitem a corrupção e o populismo econômico do atual governo, precisam rejeitar toda a sua submissão à ortodoxia convencional, precisam mostrar aos eleitores a necessidade urgente de reorganizar a nação e de definir uma estratégia nacional de desenvolvimento. Dessa forma talvez ainda seja possível evitar no Brasil o que ocorreu nos EUA. Lá, a falta de capacidade de apresentar uma verdadeira alternativa de governo custou ao Partido Democrata e ao povo americano mais quatro anos de Bush, aqui poderá indicar mais quatro anos de Lula. LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 71, professor da emérito Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda, da Reforma do Estado, e da Ciência e Tecnologia, é autor de "As Revoluções Utópicas dos Anos 60".(Folha de São Paulo de hoje)
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