DEUS NA ESCOLA

“Todos reconheceram a importância de se discutir Deus na Escola, pois as crianças precisam ter conhecimento de justiça, solidariedade, verdade, amor ao próximo, valores esses importantes e necessários para uma boa convivência em sociedade, objetivando com isso um mundo melhor para todos.”

”A Vereadora Áurea ficou satisfeita com o resultado da reunião [com representantes de igrejas, entidades e autoridades municipais], tendo em vista a importância de um projeto dessa natureza, que poderá atingir os objetivos propostos transformando nossa Itapeva numa cidade melhor, com mais fé e esperança, para isso investindo nas crianças.” (Leia mais no site da Câmara).

COMENTÁRIO. À primeira vista, tudo bem. Será?

Terei, por motivos óbvios, o máximo cuidado para falar do assunto. Antes, quero deixar claro que acho importante o ensino de religião. Nas igrejas, nas famílias, nos lares.

E ensino religioso nas escolas?

Primeiro: dúvida de ordem prática. Qual a orientação que será seguida, já que há tantas religiões, igrejas, divisões e subdivisões? A orientação virá da tradição européia, africana, asiática ou indígena, já que somos um povo de origem múltipla? Qual a versão da origem do homem será ensinada: a da ciência (evolução) ou a das religiões (criacionismo)?

Segundo: questão de ordem histórica. A liberdade para praticar a religião preferida é uma conquista importante. Conquista que somente – veja bem - o Estado leigo (separado de igreja) pode garantir.

Porque quando o Estado é ligado a uma religião, esta é imposta a todos. Basta recordar as punições da Santa Inquisição aos hereges e cientistas, caso do astrônomo Galileu, que teve de renegar a correta teoria de que o Sol é o centro do Sistema Solar, e não a Terra como a Igreja então defendia.

Mesmo nos dias atuais, Estados teocráticos (que seguem e impõem os princípios de uma religião) não permitem, por exemplo, que mulheres votem ou usem certas roupas. Em muitos países não há liberdade religiosa. Quem renegar a religião oficial será condenado à morte!

Dois movimentos são citados como decisivos para a conquista da liberdade religiosa (e de outras), inicialmente na Europa, depois no Ocidente: Reforma Protestante e Iluminismo.

Para garantir tais liberdades foi criado o Estado leigo, que passou a adotar os princípios impessoais de fraternidade, liberdade, igualdade, democracia, os direitos civis, os direitos humanos. Certamente inspirados no belíssimo ideal cristão de “amor ao próximo”.

É verdade, sim, que as pessoas têm necessidade de religião. Necessidade que é atendida pelas famílias, pelas tantas e tantas igrejas - com portas abertas e canais de TV com programas religiosos, 24 horas por dia.

Será que toda essa rede de atendimento religioso não é suficiente, necessitando ainda que as escolas municipais também entrem nessa área?

Será que as causas da desorganização da sociedade brasileira não são outras?

Será que não estamos – principalmente os políticos e eleitores – precisando aprender lições de cidadania, de civismo, de administração pública, de finalidade do Estado, de transparência, de democracia, de efetiva participação nas decisões governamentais?

Não seriam lições de cidadania que as escolas deveriam ensinar, mas não ensinam?

A prática do “leve vantagem você também” que parece predominar entre certas lideranças - especialmente as políticas, sindicais, até as religiosas – não servem de exemplo negativo para o povo? Tal comportamento não contribui, de modo decisivo, para a vergonhosa desigualdade social, uma vez que o dinheiro dos impostos não chega aonde deveria chegar?

Por último, uma pergunta: certas igrejas sabem? Como direi? Sabem, por exemplo, apoiar e indicar candidatos a seus fiéis? Se ficar em dúvida, consulte a volumosa lista dos envolvidos nos escândalos do mensalão e sanguessuga!