Tutela eleitoral |
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Editorial, Folha de S. Paulo |
A CÂMARA dos Deputados aprovou anteontem um emaranhado de alterações e adendos nas regras eleitorais. É impróprio falar em reforma; a motivação do pacote, que ainda será apreciado pelos senadores, foi aparar arestas que contrariavam o interesse eleitoral dos próprios deputados. Autorizou-se, entre outros benefícios autoconcedidos, o uso para pagamento de pessoal de até 50% das verbas repassadas pelo erário, via Fundo Partidário, às agremiações. O limite anterior, de 20%, pelo visto não dava conta de contratar, com dinheiro do contribuinte, o número de cabos eleitorais considerado suficiente pelos partidos. A cobrança de dívida das legendas, bem como sua responsabilização civil e trabalhista, ficará mais difícil. Um dos adendos nas regras proíbe que se cobrem judicialmente das instâncias superiores das legendas os passivos contraídos pelas inferiores. O desequilíbrio do resultado da votação de quarta-feira é tão grande, em desfavor do cidadão, que se podem comemorar as ousadias que os deputados desistiram de tentar. É o caso da janela de infidelidade -o período em que seria franqueado ao representante eleito trocar de sigla sem risco de perder o mandato na Justiça. Prevaleceu, na Câmara, o mesmo espírito das assessorias de candidatos quando se reúnem para, por exemplo, firmar as regras de um debate eleitoral na TV. Restringem-se a tal ponto as intervenções da imprensa e o contraditório entre os próprios políticos que o resultado é um embate anódino, dominado pela linguagem pasteurizada dos marqueteiros. A autoproteção dos políticos é a principal raiz do excesso de normatização das eleições brasileiras. Manietou-se, nessa estratégia defensiva contra a exposição pública à crítica, o uso da internet nas campanhas. Além disso, soa ridícula, pelo que denuncia acerca da falta de limites nessa sanha regulatória, a intenção de permitir as prévias dos partidos e a livre manifestação política, autorizando o cidadão a declarar-se candidato mesmo antes do início legal das campanhas, em 5 de julho do ano eleitoral. Um país democrático não deveria legislar sobre se, quando e como os partidos podem realizar prévias, nem sobre o momento exato a partir do qual um cidadão está apto a fazer campanha ou anunciar-se candidato. Esses são assuntos que só dizem respeito aos partidos e às pessoas, que têm livre arbítrio para escolher os seus próprios caminhos. Tanta minúcia legislativa, evidentemente, vale apenas enquanto atende aos próprios interesses dos políticos legisladores. Quando o tema é prestação de contas e financiamento de campanha, a frouxidão e as lacunas nas regras passam a prevalecer. A Câmara manteve aberta a brecha que permite o financiamento oblíquo e oculto de campanhas -doa-se ao partido, o nome do doador só vem a público no ano seguinte ao pleito e jamais se saberá para que candidato se destinou a contribuição. Os deputados também calaram sobre instituir a prestação de contas online das campanhas e sobre limitar o poder dos grandes doadores empresariais. Regras duras, só contra a liberdade de expressão e o direito da sociedade à informação. |
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