sábado, agosto 02, 2008

Medir para avançar rápido
Andreas Schleicher, Veja

"O Brasil passou a ter chances de melhorar quando começou a mapear os problemas de maneira objetiva – e não mais com base na intuição."

Nenhum indicador sobre a qualidade de ensino tem tanto peso e repercussão quanto o Pisa, sigla em inglês para programa internacional de aferição de estudantes, que está sob os cuidados do físico alemão Andreas Schleicher, 44 anos. Há oito, ele é o responsável pela aplicação da prova, uma iniciativa da OCDE (organização que reúne as trinta nações mais desenvolvidas do mundo). Na comparação com 57 países, o Brasil sempre aparece entre os últimos colocados em todas as disciplinas. Situação que Schleicher conhece não apenas por estatísticas mas por suas viagens ao Brasil. Desde que assumiu o cargo, ele já visitou escolas em mais de 100 países – rotina que o mantém sempre longe de Paris, onde mora com a mulher e os três filhos.

Os brasileiros apareceram, mais uma vez, entre os piores estudantes do mundo nos últimos rankings de ensino da OCDE. O que o senhor descobriu ao analisar as provas desses estudantes?
Elas não deixam dúvida quanto ao tipo de aluno que o Brasil forma hoje em escolas públicas e particulares. São estudantes que demonstram certa habilidade para decorar a matéria, mas se paralisam quando precisam estabelecer qualquer relação entre o que aprenderam na sala de aula e o mundo real. Esse é um diagnóstico grave. Em um momento em que se valoriza a capacidade de análise e síntese, os brasileiros são ensinados na escola a reproduzir conteúdos quilométricos sem muita utilidade prática. Enquanto o Brasil foca no irrelevante, os países que oferecem bom ensino já entenderam que uma sociedade moderna precisa contar com pessoas de mente mais flexível. Elas devem ser capazes de raciocinar sobre questões das quais jamais ouviram falar – no exato instante em que se apresentam.

Depois de mais de uma década de avaliações, o senhor vê avanços no caso brasileiro?
Os resultados, apesar de ruins, são sempre um pouco melhores em relação aos anteriores. Além disso, o Brasil passou a ter chance de avançar no momento em que começou a mapear os problemas de maneira objetiva – e não mais com base na intuição de alguns governantes. Isso é básico. Não dá para pensar em melhorar algo que não foi sequer dimensionado. Daí a importância da comparação internacional. Ao olhar os rankings, pais, educadores e autoridades podem começar a fazer comparações e constatar o óbvio: suas escolas estão bem atrás das dos países da OCDE.

O senhor costuma ser procurado por brasileiros insatisfeitos com os resultados?
Isso acontece. Ao saberem do fiasco nos últimos rankings, alguns políticos e especialistas de mentalidade mais atrasada me ligaram revoltados. Diziam: "Vocês estão exigindo dos alunos que falem sobre situações distantes demais da realidade deles. É injusto". A miopia dessa gente a impede de enxergar que o fato de estudantes chineses ou americanos terem a resposta para tais questões não revela apenas um despreparo dos brasileiros, mas mostra também como eles estão em desvantagem na competição com os demais. Não são, no entanto, os únicos a reagir mal. MAIS
Google
online
Google