terça-feira, dezembro 04, 2007

A SANÇÃO AOS GOVERNANTES CORRUPTOS E A REALIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS CIDADÃOS

Marli Almeida de Oliveira, advogada

Como é sabido, o ordenamento jurídico pátrio, a fim de tutelar o patrimônio público, traz em seu bojo diversos instrumentos, os quais, se bem aplicados, contribuirão em muito para a concretização dos direitos fundamentais dos cidadãos, especificados na Constituição da República, Lei maior que rege a Nação.
No entanto, assistimos, de muitas décadas, eleição e reeleição de agentes políticos corruptos que, muito embora tenham praticado atos corruptos quando no exercício de função pública, continuam em seus cargos ou, ainda, continuam concorrendo a cargos públicos e eletivos, o que ocasiona descrédito entre os cidadãos e enormes prejuízos ao erário.
Mas, por que isso ocorre? O que leva, por exemplo, a que um prefeito ou ex-prefeito municipal, mesmo sendo julgado em primeira ou segunda instância, ainda assim possa concorrer a um cargo eletivo?
Daí vem à questão. A Lei 8.429/92, assim como outras leis protetoras do patrimônio público, diz que o agente corrupto somente perderá o mandato ou terá seus direitos políticos suspensos após trânsito em julgado da decisão. Isto significa afirmar que qualquer agente político, o qual porventura tenha desviado verbas dos cofres públicos, causando sérios prejuízos à população, enquanto não for definitivamente julgado em todas as instâncias jurídicas, poderá continuar ocupando ou concorrendo em cargos públicos ou eletivos.
Necessário ter em conta que um julgamento, a fim de que se torne definitivo, leva em média dez anos, permitindo com que o político corrupto possa continuar no cargo, ou mesmo concorrer a algum cargo, em pelo menos dois mandatos, até que seja definitivamente punido pelas Instâncias Judiciárias. Isso sem falar na possibilidade de que a prescrição ocorra e o Estado não possa mais puni-lo, deixando-o impune aos ditames da Lei.
Além dessa demora no julgamento, necessário ter em conta que os agentes políticos, quando corruptos, em sua maioria contam com um esquema, também corrupto, no intuito de favorecer sua permanência na vida política. Infelizmente temos que admitir isso, o que ocorre tanto nos bastidores da própria Administração Pública como também do Poder Legislativo e Judiciário e, como não poderia deixar de ser, os defensores desses agentes utilizam inúmeras artimanhas, a fim de que o julgamento seja ainda mais demorado ou, melhor ainda para eles, que não ocorra.
Diante desta realidade, temos sim uma alternativa. Basta que os órgãos responsáveis pela aplicação da Lei se disponham a priorizar o combate à corrupção e efetivamente punir os agentes políticos corruptos.
Mas como isso seria possível, se a própria Lei 8.429/92 diz da necessidade de julgamento definitivo?
A própria Constituição Federal, em seu artigo 37, § 4º, nos dá a resposta. Basta que seja aplicado o seu comando. Basta que o julgador, seja de qualquer instância, no momento de aplicação da pena determine o afastamento e a suspensão do político corrupto, determinando, ainda, que referido agente não possa concorrer a qualquer pleito eleitoral e nem mesmo ocupar qualquer cargo público, desde que haja documentação e provas suficientes de que realmente tal agente tenha dilapidado o patrimônio público. E, na maioria dos casos, quando da propositura de ação de improbidade, os documentos que instruem a inicial já demonstram o prejuízo e a ação ímproba do agente.
Ademais, a sistemática de interpretação da Constituição Federal, em relação à adoção de princípios constitucionais, nos diz claramente que, entre um princípio e outro ou, entre uma norma e outra, há de ser aplicada a qual efetivamente contribua para a realização dos interesses maiores da República, que é exatamente a efetivação dos direitos fundamentais, em prol da dignidade da pessoa humana.
Pois bem. Em sendo assim, entre a necessidade de julgamento definitivo para efetiva punição do agente político corrupto e a garantia da tutela do patrimônio público que, consequentemente, traria enormes benefícios à população, o julgador deveria optar por esta garantia e, dessa forma, estaria agindo conforme a Constituição Federal, não havendo nada que temer.
Deveremos sempre ter em mente que o Direito se constrói, que a aplicabilidade da Lei deve estar conforme a realidade social, e se porventura haja necessidade de adequação da Lei, os juristas estão aí para isso, sempre em benefício da coletividade e em conformidade com a Lei Maior.
Agindo dessa forma, ao julgarem políticos corruptos, os julgadores já poderão sim determinar que qualquer agente público, mesmo o político, quando realizar atos ímprobos, não possa concorrer a determinado cargo público ou eletivo, mesmo que ainda não haja julgamento definitivo.
Dessa forma, os interesses maiores da Nação seriam preservados e teríamos, em contrapartida, a realização do direito fundamental ao governante honesto, bem como a efetivação dos direitos fundamentais à saúde, educação, moradia, trabalho, entre tantos outros estatuídos na Carta Maior.
Para isso, basta que os aplicadores do Direito sejam mais ousados em suas atividades diárias. Somente com ousadia poderemos modificar a realidade. A história já nos mostrou isso.
Neste sentido, importante frisar, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ao que tudo indica, já está fazendo sua parte, haja vista a instalação de Câmara Especial para processo e julgamento de prefeitos e ex-prefeitos municipais corruptos, matéria que será tratada na próxima semana.
MARLI ALMEIDA DE OLIVEIRA, ADVOGADA
Google
online
Google