sexta-feira, novembro 12, 2010

'Fábrica de clones' faz campeões em série no interior do Paraná

Autor(es): Marli Lima | De Tamarana (PR)
Valor Econômico - 12/11/2010
 

O touro Irã, um conceituado reprodutor da raça Girolando, morreu no começo do ano. No domingo, ele vai nascer novamente na fazenda experimental da Universidade Norte do Paraná (Unopar), localizada em Tamarana, próximo a Londrina. O hospital veterinário está preparado para uma cesárea, marcada para as 8 horas.
Ao lado das instalações, três outros Irãs com quase dois meses de idade pastam tranquilamente. Outro clone, Canjica, uma vaca Brangus de nove anos, mantém contato direto com ela mesma, um clone de cinco meses. O parto que está perto de acontecer é cercado de expectativas. Embora não seja a primeira experiência da equipe envolvida, vai marcar o fim de uma etapa do projeto e o começo de outra, que prevê o desenvolvimento de animais transgênicos.
A "fábrica de clones" da Unopar, que até agora recebeu investimentos de R$ 2,5 milhões, vinha sendo mantida em segredo, à espera de bons resultados. Ela começou como um laboratório de fertilização in vitro em 2007, em parceria com pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA), e a experiência com clones teve início de 2009.
Hoje, professores da Universidade de São Paulo (USP) também fazem parte da equipe. "Não estamos fazendo clone pelo clone. A ideia é fazer cópias de animais campeões, mas pensamos também na pesquisa, em dar subsídio para a implantação de pós-graduação", diz o coordenador do projeto, Otávio Ohashi, da UFPA. Ele aprendeu a fazer clones no Canadá com o brasileiro Lawrence Smith, que trabalhou com Ian Wilmut, criador da ovelha Dolly, o primeiro mamífero clonado.
Em Tamarana, empregados da fazenda mostram empolgação com as novidades. "Vai nascer mais um Irã", comenta um deles, animado. Mas ainda há uma certa confusão na maneira correta de falar dos animais que estão logo à frente. Não são filhos do Irã. Não são irmãos do Irã. São o próprio Irã, todos com uma mancha branca na testa. Apenas um brinco com um número de identificação diferencia um do outro.
Mais emblemático é o fato de que no local também há filhos do Irã, mais velhos que os clones. "Começamos de brincadeira e saiu. Foi um susto", admite Marco Antonio Laffranchi, fundador e presidente da Unopar, que tem cerca de 140 mil alunos no ensino presencial e a distância, em 109 cursos. "Foi o primeiro clone do Paraná e o primeiro de uma universidade privada", completa.
Laffranchi, que lembra que Irã "era um touro magnífico", gostou dos resultados e decidiu ir além. O objetivo agora é avançar em transgenia. "O clone é o melhor caminho para a vaca transgênica e vamos chegar nela", afirma.
Em janeiro será dada a largada para o plano que prevê o nascimento de 10 a 15 clones por mês, alguns geneticamente modificados, que produzem proteína de interesse comercial (fármacos, como o hormônio do crescimento) e são a aposta de um bom retorno financeiro. O empresário, de 74 anos, também é dono de agropecuária e de quatro fazendas. O faturamento do grupo não é revelado.
Ele conta que 2 mil bezerros vão ser fecundados no laboratório em 2010 e fechou contrato de exportação de mil embriões de Girolando para o Panamá. Será a primeira venda externa e há outra negociação em andamento, para exportação de gado para a Argentina. Questionado sobre o que pensa de clonagem humana, a resposta é rápida. "Tenho medo. Eu não faria."
Os quatro clones que estão na fazenda da Unopar são quase como um troféu para os pesquisadores. O biólogo Moysés Miranda, também da UFPA, diz que eles terão vida normal. Mas nem todos os clones planejados sobreviveram. Para a cópia geneticamente idêntica de Canjica foram feitas 19 transferências de embriões para barrigas de aluguel. Sete resultaram em gestação, quatro animais nasceram e um sobreviveu.
No caso de Irã, das 25 transferências, 13 viraram gestações, nove nasceram e três estão vivos. Além de problemas pulmonares e cardíacos, alguns clones nasceram com umbigos grandes, que resultaram em cicatrização mais demorada e em morte por infecção. Um nasceu também muito pesado, com 58 quilos, quando o esperado é por volta de 36. Mesmo assim, o biólogo Paulo Roberto Adona, da Unopar, diz que um dos grandes diferenciais da equipe é a "alta taxa de prenhez e de nascimentos".
O cuidado pré e pós-nascimento, após 285 dias de gestação, é intenso. A equipe multi-institucional e multidisciplinar é composta por 30 pessoas, entre professores e alunos. A indução do parto da vaca que carrega na barriga o 10º Irã começou na quarta-feira. Duas pessoas vão fazer a cirurgia e o clone receberá os cuidados neonatais, para saber se está respirando bem, como estão os batimentos cardíacos e o tamanho do umbigo.
Ele vai para um berçário para receber banho de água fria, depois quente, e ser esfregado por compressas que simulam a língua da vaca e estimulam a circulação. Também receberá nas primeiras seis horas mamadeira com colostro coletado de outro animal, para aumentar a imunidade - nem sempre a vaca que carrega o clone produz leite. O bezerro fica no hospital em observação por 15 dias, com acompanhamento 24 horas. Na sala de medicamentos há até genérico do Viagra, para estimular o coração do bicho.
Além do 10º Irã, há mais quatro gestações de clones em andamento em Tamarana. Todos foram feitos a partir de células somáticas, que formam órgãos, peles e ossos (a Dolly foi feita com células mamárias). Na Unopar, são retirados fragmentos da pele da base da cauda dos animais. Essas células são transferidas para óvulos que tiveram o material genético (núcleo) da vaca retirado. Com estímulos elétricos, ocorre a fusão que gera um embrião. Ele é transferido para a barriga de aluguel no 8º dia e o clone nasce nove meses depois.
Uma vez dominada a técnica, é possível obter animais com qualidade zootécnica de modo mais rápido que a reprodução natural. O método deve ser usado em breve também para a reprodução de bois termotolerantes, que resistem a temperaturas mais elevadas.
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