quinta-feira, agosto 23, 2007

Pelo fim da farra dos vereadores
Jornal do Brasil

MAIS um capítulo do embate entre o Legislativo e o Judiciário volta à pauta de discussões da Câmara. Trata-se da emenda constitucional que anula a decisão de reduzir a multidão de vereadores do país - medida moralizadora aprovada em 2004 pelo Tribunal Superior Eleitoral.
A Constituição de 88 estabelece que uma Câmara de Vereadores deve ter entre nove e 55 integrantes, dependendo da população do município. Baseados no texto constitucional, os ministros do TSE decidiram, há três anos, eliminar 8.538 vagas nos legislativos municipais, ou 14% das cadeiras existentes. Desde então, o Congresso vem tentando neutralizar o corte com a Proposta de Emenda Constitucional 333/04, já aprovada em comissão especial na Câmara.

Pela resolução do TSE, foram criados 36 "níveis" de cidades. Municípios com até 47.619 habitantes (quase 90% do total) foram obrigados a se restringir ao número mínimo de vereadores. O substitutivo da PEC cria 24 faixas - e faz com que qualquer cidade acima de 15 mil habitantes tenha mais de nove representantes.

Para espanto do cidadão de bem, o ardil conta com maciço apoio no Legislativo - sobretudo entre os deputados do baixo clero, sempre movidos pelos mais escusos interesses paroquiais.

Esta é uma grande oportunidade para enfatizar o necessário debate sobre o papel das Câmaras de Vereadores, o tamanho do gasto que representam para o Estado brasileiro e a anomalia danosa do que os especialistas chamam de "federalismo truncado", resultado da Constituição de 88. Há alguns anos debruçado sobre o tema, o economista Eduardo Giannetti apresentou recentemente um cálculo elementar na forma e complexo nas conseqüências: são quase 61 mil vereadores espalhados pelo país. Custam em torno de R$ 3 bilhões por ano.

Não se trata apenas de um problema de caixa. É um caso exemplar de desvio democrático. Com a ampliação da parcela dos municípios no bolo da receita pública, estabelecida pela Constituição de 88, houve uma onda de emancipações de distritos, resultando em mais de mil novos municípios no país - até alcançar o impressionante número de 5.561.

Com raras exceções, essas cidadelas não têm receita própria suficiente para seus gastos. Vivem das transferências recebidas da União e dos Estados - os repasses do Fundo de Participação dos Municípios. Assim, o dinheiro que deixou de ser aplicado em saúde, educação, saneamento básico foi para o ralo da sustentação de prefeituras, câmaras de vereadores, secretarias e toda a estrutura administrativa.

Mesmo nas grandes cidades - onde, em tese, não faltaria trabalho ao vereador - a função do legislador municipal vem sendo vencida pelo ócio. No Rio de Janeiro, os 55 edis analisaram em plenário, nos primeiros cinco meses do ano, apenas 139 projetos. Sancionaram 78 - sendo 20 para distribuição de medalhas e 11 para inclusão de datas oficiais no calendário (como Dia do Passista ou Dia do Atleta). Apenas 19 projetos efetivamente interferiram no dia-a-dia do município. Mais uma prova de que a artimanha urdida no Congresso, se consumada, contribuirá para debilitar a democracia brasileira, minada pela prevalência de interesses menores.

Sabe-se que vereadores são cabos eleitorais de deputados e senadores. Espera-se que a sensatez oriente o Congresso. Seus integrantes serão julgados pela opinião pública.
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