segunda-feira, agosto 14, 2006

Populismo cambial: quem paga o pato é a classé média

Preste atenção nesta entrevista. Luiz Carlos Mendonça de Barros é economista, homem do mercado financeiro. Trabalhou no governo. Conhece a coisa dos dois lados. E é língua-solta. Posiciona-se ao lado dos desenvolvimentistas, contra os monetaristas (que só pensam em segurar a inflação).

Faz uma análise interessante da política econômica. Que não é boa para o crescimento, mas é eficiente politicamente! Agrada os banqueiros e rentistas (que financiam e dão sustentação política ao governo). Agrada os pobres, que dão voto para a reeleição.

Quem dança é quem está no meio, que perde o emprego e salário.
Trechos da entrevista dada a Fernando Canzian (Folha de SP)
“É evidente que a incorporação e a redução da pobreza é uma situação que não se pode ir contra. Ela faz sentido, seja do ponto de vista econômico, social ou político. O que precisamos ver é como isso se deu. Se faço a economia crescer 6% ou 8% ao ano e direciono os gastos do governo para os mais pobres, essa é a forma correta de acoplar crescimento econômico com desenvolvimento social.
Mas não é isso o que está acontecendo. Se olharmos a melhoria de renda no Brasil hoje, 70% dela é devido ao câmbio, via o canal dos alimentos, que pesam 70%, 80% no consumo dos mais pobres. Em outras palavras: com o mesmo salário nominal e com o salário mínimo crescendo em termos reais, você teve um poder de compra 60% maior nos alimentos. É isso que mudou na renda.

Eu só acredito que haja um processo de desenvolvimento econômico, de melhoria de distribuição de renda, quando ele é baseado em emprego, salário e mais educação. Não é isso o que estamos vendo, ao contrário.

É evidente que quem ganha até dois salários está vivendo muito melhor. Agora, como é que eu chego para esse sujeito e digo: "Olha, você precisa tomar cuidado porque o que nós estamos fazendo é gastando poupança, que podia estar sendo feita para melhorar a situação do seu filho e a sua situação mais à frente". Isso não é dito.

Nesse sentido, o populismo cambial do Lula é mais grave que o de Fernando Henrique, porque lá atrás era com dinheiro emprestado.

O juro está errado. Temos um juro real de 10% e é muito difícil crescer assim. É um negócio tão desproporcional que chama a atenção. Mas o que vemos é o Lula acomodado. Ele é o maior defensor da taxa de câmbio valorizada. Pois é o maior beneficiário.

Lula é um oportunista. "Por que eu vou mudar uma coisa que está me dando esse tipo de popularidade?" É difícil. Veja, o Fernando Henrique passou pelo mesmo processo. "Por que eu vou mudar o câmbio se eu estou tão bem?" É difícil para quem não é do ramo, para quem não é economista.
Não é só o pobre que está se beneficiando. O rico também está, via mercado financeiro. Você olha os lucros dos bancos brasileiros, é um crime. E quem é que está perdendo? É quem está no meio. O cara que ganhava oito salários mínimos e depois ficou desempregado porque a fábrica precisou reduzir custos e agora está ganhando cinco salários. O cara que ganhava cinco, que hoje ganha dois. A agricultura está perdendo. O setor exportador. Se você abrir a indústria, tem setores que já estão em processo de recessão.

Talvez a história venha mostrar que a maior marca do Lula foi ter provocado a maior divisão na sociedade.

É uma divisão absolutamente irracional, que reflete um pouco a falta de coerência política do PT e do Lula. O banqueiro ganha e o sujeito do Bolsa-Família ganha. Ganha o rentista e o sujeito que ganha até dois salários. E o sujeito que está trabalhando? Você pega o salário de um engenheiro recém-formado e vê que ele foi proletarizado. Por quê? Porque não tem demanda. É um momento muito angustiante.

Hoje, nós estamos tirando renda da parte eficiente da economia e dando para o governo para distribuir isso para o sujeito comer. Isso é muito bom do ponto de vista da distribuição de renda, mas do ponto de vista de uma economia de mercado é o pior caminho que você tem. Nós temos 39% do PIB de carga fiscal e ainda temos déficit no governo.

A equação para mim é muito clara: é reconhecer que a parte externa me permite ser muito mais ousado em termos de crescimento econômico. Mas, para eu ousar mais, preciso restabelecer uma certa eficiência econômica, que começa pela redução da despesa do governo. Ela permitirá, posteriormente, uma redução da carga tributária e dos juros maior do que o governo vem fazendo.

Eu trabalhei no governo. Estive lá no Plano Cruzado, depois no Real. Vivo o mercado. O Brasil tinha um coração fragilíssimo. Se desse um pique, tinha um treco. Levava um susto de fora, outro treco. Não havia reservas. Você tinha déficit de dólar. Isso mudou. Me dá desespero e vontade de sair gritando na rua: "Não é possível que vocês não enxerguem isso!".

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